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  Félix Peña

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 Diario Valor Económico | 13 de julio de 2005

O semestre uruguaio no comando do Mercosul


Gestão deveria buscar avanços na direção estratégica reafirmada na Cúpula de Assunção. O presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez, exercerá até dezembro próximo a presidência interina do Mercosul. Vázquez tem pela frente uma tarefa difícil. Por isso, merece todo o apoio dos países parceiros e de quem compartilhe a idéia de que é preciso evitar uma deterioração adicional do projeto comum. Não por razões de um romântico idealismo. Tampouco somente por razões econômicas ou comerciais. Mas sim pelo que o projeto tem como sentido político, em termos de assegurar a qualidade das relações entre as democracias do sul das Américas e a possibilidade de que elas cumpram um papel estabilizador em uma região sul-americana com várias frentes de tormentas evidentes.

Que o Mercosul tem problemas é algo suficientemente diagnosticado. Às vezes, com a precisão dos técnicos, como no caso do primeiro informe semestral da Secretaria Técnica - logo retirado de circulação e sem que voltassem a publicar edições seguintes. Por vezes, inclusive, com o exagero natural de quem defende seus interesses comerciais, ainda que estes nem sempre sejam de grande magnitude. Mas não parecem ser, necessariamente, problemas insolúveis. Como evidencia a crise da União Européia, problemas são naturais neste tipo de processos.

Podemos vislumbrar quatro cenários para o semestre da presidência a cargo do Uruguai. Calibrar bem qual é o cenário a privilegiar será crucial para assegurar um êxito razoável.

Um deles é o de um colapso total ou de um retrocesso formal - por exemplo, a uma zona de livre comércio sem as qualidades que hoje existem entre muitos países, que incluem regras de origem específicas. É um cenário possível, não desejável e pouco provável.

O outro é o de uma combinação de imobilismo no substancial e uma certa dose de "efeitos especiais" - isso seria jogar para a platéia, numa espécie de Mercosul de fachada. Também é possível, ainda que não desejável. É preciso reconhecer que é provável, pois talvez para alguns isso poderia ser desejável.

O terceiro é de um forte salto adiante, uma espécie de tratamento de "choque" de credibilidade para o projeto comum. Em teoria, é desejável e também possível. Ainda assim, as realidades políticas internas de vários dos parceiros tornam isso pouco provável. Não se observam fatores que possam gerar estímulos suficientemente poderosos para que assim seja.

E o último cenário é o de buscar avanços na direção estratégica reafirmada na Cúpula de Assunção. É desejável e possível, e poderia ser o mais provável e recomendável para o semestre corrente. Implicaria em um pragmatismo razoável, orientado para tornar possível um objetivo de longo prazo que seja reconhecido como valioso.

Uma consideração de fundo pode contribuir para que esse último cenário prevaleça. É a constatação de que entre os parceiros no Mercosul - todos com complexas agendas internas e fortes desafios externos -, o problema principal não são necessariamente as assimetrias existentes. Em sua maioria, elas fazem parte das realidades geográficas, políticas, econômicas e, inclusive culturais. Mesmo quando, por vezes, são assimetrias artificiais que desnivelam o campo de jogo, especialmente na orientação dos investimentos, o certo é que também fazem parte da realidade.

Por outro lado, o problema principal a ser abordado é que por incidência das assimetrias, entre outros fatores, muitas vezes se rompe o equilíbrio de interesses nacionais que explica o vínculo associativo. Ou seja, que o que sustenta a vontade dos parceiros de continuar compartilhando - com base na percepção de benefícios mútuos - é um projeto orientado para a integração de suas economias e para competir e negociar juntos no cenário internacional. Cabe recordar o profundo sentido político do projeto comum a cada vez que os efeitos das assimetrias econômicas produzem desequilíbrios comerciais em setores sensíveis, instalando a idéia de que tudo fracassou.

Quais podem ser, então, as linhas de ação recomendáveis para o Mercosul no semestre? Recordemos, a respeito, que há roteiro de ação inscrito no Programa 2004-2006. Ele continua válido e inclui metas como facilitar a circulação de bens na união aduaneira (Decisão CMC 54/04). A isso somam-se tarefas que surgem do acordado recentemente em Assunção em relação ao Fundo para Convergência Estrutural e para a criação do Parlamento do Mercosul, instituição concebida com prudência e realismo, que pode contribuir para o objetivo traçado pelo presidente Tabaré Vázquez em Assunção, qual seja, o de "tornar o Mercosul mais pleno de cidadania".

Três outras tarefas podem contribuir para o êxito do Mercosul no semestre. As três relacionam-se com métodos de trabalho, plano no qual deficiências são mais notórias, contribuindo para explicar a sensação de mal-estar que, com razão, constatou o presidente Lula em seu discurso em Assunção.

A primeira tarefa é a de um efetivo fortalecimento institucional, entendido como um funcionamento mais eficaz dos mecanismos existentes. Isso inclui o Grupo Mercado Comum, verdadeiro braço executivo; as reuniões periódicas dos ministros da Economia e da Indústria, como âmbitos de coordenação das políticas nacionais macroeconômicas e setoriais; o reconhecimento do papel fundamental que pode desempenhar a articulação com a Secretaria Técnica, crescentemente concebida segundo o modelo da Direção Geral da OMC, e não necessariamente como um embrião de Bruxelas, e do Comitê de Representantes Permanentes e sua presidência e, finalmente, o funcionamento efetivo do mecanismo de solução de conflitos já acordado.

A segunda é a de uma melhoria na qualidade das regras de jogo - inclusive as que permitam contemplar os efeitos de assimetrias existentes - e principalmente a de obter maior transparência nos processos de criação normativa - a atual página do Mercosul na Web deixa muito a desejar.
E a terceira tarefa é pôr em prática maior coordenação para encarar em conjunto as negociações econômicas internacionais, tanto no plano do comércio como no de investimentos extrangeiros.
Um avanço significativo nos métodos de trabalho permitirá abordar com maior eficácia complexas questões pendentes no plano da articulação de setores produtivos, especialmente na indústria automobilística, como também na relação com a integração energética e da infra-estrutura física, ambas com natural dimensão sul-americana.

Sem dúvida, a chave para este semestre e para o futuro do Mercosul pode estar em manter a ambição dos objetivos estratégicos já traçados para melhor aproveitar as oportunidades e desafios que foram criados pelo novo mapa da competição econômica mundial; porém, simultaneamente preservando a idéia de que um espaço de integração consensual entre nações soberanas é construído gradualmente, sem queimar etapas e assegurando benefícios mútuos.


Félix Peña es Director del Instituto de Comercio Internacional de la Fundación ICBC; Director de la Maestría en Relaciones Comerciales Internacionales de la Universidad Nacional de Tres de Febrero (UNTREF); Miembro del Comité Ejecutivo del Consejo Argentino para las Relaciones Internacionales (CARI). Miembro del Brains Trust del Evian Group. Ampliar trayectoria.

http://www.felixpena.com.ar | info@felixpena.com.ar


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