Pela Resolução nº 861, publicada no Boletim Oficial
argentino de 16 de julho, o ministro da Economia da Argentina estabelece
uma medida de salvaguarda que determina a fixação de cotas
anuais para as importações de tecidos de algodão
e suas mesclás originárias do Brasil. Medida semelhánte
foi establecida para as impòrtaçoes provenientes do Paquistão
e da China. As salvaguardas foram estàbelecidas conforme o artigo
6 do Acordo sobre Têxteis é Vestuários (ÀTV)
incorporado à ordem jurídica argentina pela Lei n° 24.425,
sancionada em 1995. Sua aplicação foi solicitada pela Federação
Argentina das Indústrias Têxteis. A Comissão Nacional
de Comércio Extèrior constatou a existência de dano
grave à indústria nacional e circunstâncias excepcionais
e críticas, de acordo com o estabelecido pelo ATV.''
Afirmou-se que essa decisão do governo argentino implicaria não
cumprimento de compromissos assumidos no Mercosul. Desejo referir-me a
esse aspecto da questão, quer dizer, sua conformidade com o efetivamente
pactuado. A união aduaneira é o que foi pactuado não
o que a teoria ou os manuais indicam que deveria ser.
O Mercosul tem um obvio conteúdo econômico e uma clara dimensão
política que condicionam sua abrangência e seu ritmo de avanço.
Rèfletem-se em compromissos formais expressos em regras jurídicas
incorporádas às respectivas ordens jurídicas nacionais.
Determinam ó que se pode fazer ou não. Geram direitos obrigações
dos Estados mèmbros e tambem de seus sujeitos de direito. É
a ponte entre um conceito, abstrato de união aduaneira e o que
realmente os sócios estão dispostos a aceitar. Na relação
comercial entre a Argentina è o Brasil, os do Mercosul se inserem
em um marco mais amplo de compromissos que incluem a Aladi e a OMC. As
relações entre as três fontes de direitos e obrigações
articulam-se segundo normas positivas contidas em seus textos originais
e derivadas.
Em várias conversações mantidas foi aceito o argumérito
de que a medida não deveria ser aplicada ao Brasil porque isso
não é permitido pela norma vigente. Examinou-se a fundo
a argumentação apresentada, e não se encontrou base
legal sólida que permitisse negar o direito invocádo por
uma parte interessada que reclamava a aplicação das salvaguardas.
Nenhuma norma do Mercosul exclui a possibilidade da aplicação
desse tipo de salvaguarda. Há, na matéria, um claro vazio
legislativo. Nenhuma iniciativa dos sócios tentou preenchê-lo.
A única norma vigente na matéria - o regulamento relativo
à aplicação de salvaguardas às importações
provenientes de países não membròs do Mercosul, aprovado
pela Decisão CM17/96 - assinala explicitamente as salvaguardas
do artigo XIX do Gatt 1994 e estabelece que aos produtos têxteis
serão aplicadas as disposições do ATV. Os textos
são claros. Esse regulamento- não aplicável às
salvaguardas do ATV- estabelece que, quando um sócio aplica salvaguardas
importações provenientes de outros países, excluem-se
as originárias do Mercosul. A Argentina cumpriu essa norma ao excluir
as importações do Brasil das salvaguardas aplicadas em 1997
aos calçados. Essa exceção não foi compreendida
em toda a suá dimensão jurídica pelo rebente parecer
do painel sobre calçados da OMC que a considera, incorretamente,
uma violação do Acordo de Salvaguardas. Essa exceção
explica que havia ocorrido um aumento muito vigoroso de importações
de calçados originários do Brasil, fato significativamente
acentuado, em 1999, depois da desvalorização do real, gerando
um problema ainda não-resolvido no comércio bilateral. A
Resolução Ministerial n° 861 ajusta-se ao ATV e à
legislação vigente. Não viola nenhum compromisso
da Argentina no Mercosul. Não existem argumentos jurídicos
válidos para excluir o Brasil de uma medida prevista em um compromisso
internacional que é lei da nação. Outra resolução
ministerial aplica uma medida parecida ao Paquistão, também
membro da OMC. Aplicar a medida ao Paquistão e não ao Brasil
poderia ser considerado pela OMC uma discriminação, sem
que esta pudesse invocar uma norma do Mercosul, como foi possível
fazer em circunstâncias legais diferentes, no caso das salvaguardas
dos calçados.
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